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sábado, 11 de setembro de 2010

INTERDISCIPLINARIDADE

Noções Básicas sobre Interdisciplinaridade

Rita Patrícia Almeida de Oliveira


1. Interdisciplinaridade um sonho possível?



Começo este texto com uma pergunta, que talvez só possa ser respondida pelo educador daqui há alguns anos e se por ventura esse educador abraçar essa causa.

Segundo alguns autores como Nogueira (1998), A interdisciplinaridade tem sido o grade dos educadores que procuram praticá-la em seu cotidiano escolar, com o pouco conhecimento que possuem. Visto que a própria teoria interdisciplinar, suas informações e conceitos não conseguiram o eco esperado no ambiente escolar. Muitos podem ser os fatores que ocasionam esse processo, talvez pela dicotomia teoria e prática ou pela formação dos professores tanto inicial quanto a continuada.

Por isso sua prática tem sido escassa e, em alguns casos uma (pseudo) interdisciplinaridade é praticada, porém sem levar em considerações alguns casos conceitos fundamentais de aplicabilidade e de operacionalização.

Apesar de todos esses percalços buscaremos apresentar um estudo que possibilite um maior conhecimento e interação com essa tendência pedagógica, para isso buscaremos atreves de um trecho dos PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais, apresentar as idéias principais que nos levaram a o estudo dessa prática pedagógica.

De acordo com os PCN (1999) “... Os alunos constroem significados a partir de múltiplas e complexas interações”. Cada aluno é sujeito de seu processo de aprendizagem, enquanto o professor é mediador na interação dos alunos com os objetos de conhecimento: o processo de aprendizagem compreende também a interação dos alunos entre si, essencial à socialização. Assim sendo, “as orientações didáticas de aprendizagem coerentes com essa concepção” Brasil (1999, p.93).

Algumas perspectivas se enquadram nesse trecho dos PCN (1999):



Primeiro levando em conta a Perspectiva Piagetiana, podemos mencionar o conhecimento como:



 Conhecimento Físico: é aquele obtido diretamente do objeto por meio da experiência.

 Conhecimento Lógico-matemático: é obtido nas ações sobre o objeto e nas descobertas que essa ação propicia.

Segundo Piaget (1977), o conhecimento não pode ser concebido como algo predeterminado pelas estruturas internas do sujeito, nem pelas características do objeto. Todo conhecimento é uma construção, uma interação, contendo um aspecto de elaboração novo. Portanto as estruturas formam-se mediante uma organização de ações sucessivas exercidas sobre os objetos. É o caso da assimilação e acomodação, onde a primeira se baseia no processo cognitivo de classificar novos eventos em esquemas existentes e a segunda é a modificação de um esquema ou de uma estrutura em função das particularidades do objeto a ser assimilado. Buscando sempre o ponto de equilibração.

Segundo em relação à Função Social, para Vigotsky, o papel da interação social no desenvolvimento das funções mentais superiores é fundamental. Oliveira (1992) destaca que a aprendizagem desperta processos internos de desenvolvimento que só podem ocorrer quando o indivíduo interage com as outras pessoas.

Diferente de Piaget, que busca a equilibração como um princípio básico para o desenvolvimento cognitivo, Vigotsky parte da premissa que o desenvolvimento não pode ser entendido sem levar em consideração o contexto social e cultural no qual o indivíduo está inserido, ou seja, o desenvolvimento cognitivo não ocorre independente no contexto social, histórico e cultural.

O elo entre estas perspectivas, segundo Nogueira (1998), é a necessidade de manter o aluno ativo, interagindo e participando efetivamente do seu processo de aprendizagem. Obtendo conhecimento físico e lógico-matemático a partir da interação social ou desenvolvendo as múltiplas competências.

Em todos os casos acima citados, não se pode imaginar o aluno em sala de aula sendo mero ouvinte e o professor o detentor do conhecimento absoluto. É importante frisar que a interdisciplinaridade não representa a solução para todos os problemas enfrentados pela educação, mas a possibilidade de uma proposta diferenciada, que deve ter a atenção especial do educador.

Essa perspectiva faz uma revisão do sentindo do saber escolar e destaca a importância da compreensão da realidade pessoal e cultural por parte dos professores e alunos. Nesse caso se faz necessário conhecer melhor a interdisciplinaridade que para autores como Fazenda (2001,p.35), se concebe da seguinte forma: Uma nova atitude diante da questão do conhecimento de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e de aparentemente expressa colocando-os em questão.

Ainda segundo Fazenda (2001), cinco princípios subsidiam uma prática docente interdisciplinar: humildade, coerência, espera respeito e desapego, Além disso, destacamos que todo o projeto interdisciplinar exige a contextualização, para o resgate do tempo e do espaço no qual se aprende.

Dessa forma, trabalhar num contexto interdisciplinar representa uma forma de ensino-aprendizagem, que pode favorecer ao estudante deixar de ser simples observador e passar a ser sujeito do processo, junto com o professor. Existem algumas práticas diferenciadas propostas por essa tendência, como: a escolha de uma situação-problema que favoreça a análise, a interpretação e a crítica; a atitude de cooperação que leva o professor a se tornar um aprendiz e não apenas um especialista; a busca de um percurso que estabeleça conexões entre os fenômenos e que questione as idéias de uma versão única de realidade; aproximação atualizada dos problemas das disciplinas e dos saberes, entre outros, pois não se deve esquecer que aprendizagem vinculada ao fazer, à atividade manual e à intuição também é uma forma de aprender, como nos coloca Hernández: A escola e as práticas educativas fazem parte de um sistema de concepções e valores culturais que faz com que determinadas propostas tenham êxito quando se unem com algumas necessidades sociais e educativas. (1998, p. 45).

Em nosso estudo, a interdisciplinaridade não deve ser encarada com um “modismo”, mas como uma prática pedagógica viável dentro da escola, tomando como referência as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – Parecer CEB-CNB n. 15/99, instituídas pela resolução n. 03/99, que entre outras disposições, determina que os currículos se organizem em áreas.

A Base Nacional Comum estruturada pelos princípios pedagógicos da interdisciplinaridade, da contextualização, da identidade e autonomia, redefinindo, de modo radical, a forma como têm sido realizadas a seleção e organização de conteúdos e a definição de metodologias nas escolas em nosso país.

Um aspecto importante é o fato de que no meio acadêmico não existe um discurso único entre os autores a respeito do conceito de interdisciplinaridade. Por isso utilizaremos principalmente, as visões de três autores: Yves Lenoir et al (2001), Gerárd Fourez (2001) e Ivani Fazenda (1998). Esses autores têm em consonância a visão de que uma das finalidades da interdisciplinaridade é contribuir para a mudança e não representar uma prática pedagógica acabada e final. Além disso, ela tem no mínimo uma tarefa transgressora, o desafio de continuar repensando o sentindo do conhecimento e das relações com os diferentes saberes e as transformações do sistema educacional da modernidade. Sendo assim, a definição funcional de interdisciplinaridade utilizada para análise dos resultados dessa pesquisa foi baseada em Lenoir (2001), em uma perspectiva instrumental, que descreve essa prática como uma perspectiva preocupada com as interações externas, enfatizando a operacionalidade das questões sociais e tecnológicas, através de projetos, que buscam desenvolver os problemas concretos.

Acreditando que com o emprego do ensino interdisciplinar na escola, inclui-se uma prática diferenciada de ensino-aprendizagem, fundamentada no modelo do aprender a aprender, com uma imersão no trabalho cotidiano docente, este tem outras finalidades ampliar a ação do estudante, sua compreensão e sua participação no que diz respeito a todo o processo que essa prática possa proporcionar além de representar para o educador, um desafio no sentido de articular sua disciplina com outras, o que permite tornar significativa a relação ente o ensinar e o aprender.

Nesse sentido, a interdisciplinar será abordada no intuito de perceber que essa não é apenas mais uma prática escolar, que pode cair num discurso vazio, mas sim uma possibilidade real de um trabalho global e singular e para isso buscaremos descobrir seus mecanismos de implantação dentro da escola.

Outras questões podem ser destacadas e estão na contramão da interdisciplinaridade, são eles: velhos paradigmas, a falta de socialização do saber acadêmico, a dicotomia teoria x prática. Tudo isso nos mostra a importância do resgate de uma visão mais ampla e global de mundo, como nos assinala MORIN (2000,p.70-71):

Não basta agitar a bandeira global: devem-se associar os elementos do global com uma articulação organizadora complexa, deve-se contextualizar esse global. A reforma necessária do pensamento é aquela que engendrará um pensamento do contexto e do complexo.



Ressaltamos, também, que a elaboração e execução de atividades interdisciplinares na escola não concorrem para o detrimento das disciplinas, pelo contrário, visa aprofundar e articular essas disciplinas, vinculado-as à realidade.

Destacamos ainda que o trabalho interdisciplinar se dispõe a superar barreiras complexas e revelar para o homem o que seja a visão de totalidade, a partir das visões fragmentadas, tão comuns no âmbito escolar. Para tanto se faz necessário que o professor compreenda algumas diferenças entre as quatro propostas, não entendendo que uma é mais importante que a outra, mas sim que haja segurança da sua utilização, quando serem for atividades, muli, pluri, trans, ou interdisciplinar.



2. Da Multidisciplinaridade a Interdisciplinaridade


Por certo que não existe uma teoria sedimentada e única sobre interdisciplinaridade, em face da dicotomia teoria x prática. Mas em nossas pesquisas foi possível perceber que nas produções acadêmicas alguns autores se baseiam em conceitos advindos de algumas práticas construídas dentro da própria escola ou em ambientes que necessitam de uma visão interdisciplinar. Baseando-nos em Fourez (2001),temos:

 Multidisciplinaridade- É definida como a justaposição de diferentes conteúdos de disciplinas distintas, em torno de um tema comum, porém sem nenhuma preocupação com integração anterior.

 Pluridisciplinaridade- Essa prática consiste em examinar as perspectivas de diversas disciplinas em uma questão específica ligada a um conhecimento preciso.

 Transdisciplinaridade- É um sistema sem fronteiras, em que a integração chega a um nível que é impossível distinguir onde termina e onde começa uma visão interdisciplinar.

 Interdisciplinaridade- A tônica é o trabalho das diferentes áreas do conhecimento. Um real trabalho de cooperação e troca, aberta ao diálogo e a planejamento posterior, em uma determinada situação considerada.



3. Algumas dificuldades enfrentadas para a implantação da interdisciplinaridade no ambiente escolar (NOGUEIRA,1998) :



 Romper com velhos paradigmas;

 A dicotomia teoria x prática;

 A fragmentação do conhecimento;

 A falta de popularização da pesquisa acadêmica;

 A falta da postura do professor reflexivo/pesquisador;

 A interdisciplinaridade e a pseudo-interdisciplinaridade;

 A importância da formação continuada do professor;

 A obrigação de cumprir com 100% dos conteúdos propostos;

 O desinteresse do professor, por essa prática representar “mais trabalho”

 A postura do professor (individual x grupo);

 A falta da presença do especialista.



É importante esclarecer que apesar de inúmeros problemas para a implantação dessa tendência, elencados anteriormente, algumas atitudes, posturas e ações são importantes na aplicabilidade de uma prática interdisciplinar, como por exemplo:



3.1 Atitude interdisciplinar



Que de acordo com Fazenda (1988), é uma atitude diante de alternativas para conhecer mais e melhor, atitude de espera ante os atos consumados, atitude de reciprocidade que impele à troca, o diálogo, além a humildade diante das limitações do próprio saber, além dos desafios perante o novo e também em redimensionar o velho, além do compromisso em construir sempre da melhor forma possível, atitude de responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, revelação, de encontro.



3.2 Situações-problemas



É o foco principal de uma prática interdisciplinar, deve ser de interesse dos educandos, é a situação que deve ter o lugar para criação e construção, além de proporcionar ao estudante a oportunidade de ser instrumento de seu próprio desenvolvimento, através de desafios e reflexões.



3.3. Os projetos e atividades Interdisciplinares



Tratando-se de um projeto interdisciplinar, um dos objetivos que se pretende atingir é a interação entre as disciplinas e os diferentes saberes das diferentes áreas do conhecimento, E espera-se que a interação ocorra por parte de todos os participantes do processo de ensino-aprendizagem. E que as diferentes disciplinas ministradas sirvam de subsídios para que cada estudante realize mentalmente sua própria interação.

A interdisciplinaridade não precisa estar necessariamente atrelada a um projeto, pois quando a comunidade escolar está imbuída do espírito interdisciplinar, qualquer assunto, por mais simples que seja, pode ser tratado nessa postura, inclusive as seqüências didáticas e outras atividades.



4. Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, Orientações Curriculares Nacionais – OCN



Os PCN incentivam a reelaboração das propostas curriculares, procura flexibilizar e responsabilizar cada educador na elaboração do projeto político pedagógico das instituições de ensino.

Os objetivos dos PCN é propor o desenvolvimento da capacidade do educando, considerando que ao serem desenvolvidas essas capacidades, poderão posteriormente se expressar em diferentes comportamentos.

As orientações didáticas dos PCN mencionam a necessidade dos alunos construírem significados oriundos das múltiplas vivencias, quando o professor nesse caso deverá assumir seu papel de mediador desta interação dos sujeitos com os objetos do conhecimento, bem como os demais sujeitos do meio é assim que os PCN percebem a interdisciplinaridade.

As Orientações Teóricos Metodológicas –OCN enfocam que por diversas vezes a interdisciplinaridade é confundida com o trabalho coletivo ou como uma forma de se opor às disciplinas escolares.



Não basta uma justaposição de várias disciplinas para atingir a competência crítico-analítica mencionada. Trata-se da construção de um novo sabe a respeito da realidade, recorrendo-se aos saberes disciplinares e explorando ao máximo os limites e as potencialidades da cada área do conhecimento. O quanto será ultrapassado do limite de cada disciplina dependerá do projeto inicialmente elaborado. (BRASIL,2008,p.52)



A percepção do conceito de interdisciplinaridade, competência e contextualização exposta nas OCN é um convite à reflexão acerca do ensino no nível médio. Um dos pontos importante é que essa proposta não pode ser simplificada, pois essa postura dificulta no lugar de simplificar sua implantação em sala de aula.















1. Equipe interdisciplinar



Uma prática interdisciplinar é norteada por inúmeras ações, que o professor deve estar preparado a executar, começando por sua própria postura diante dessas ações, além disso, segundo Fourez (2001) o educador não pode fazer essa prática sozinho, ele necessita de uma equipe que participe dessas idéias, proporcionando encontros periódicos, reflexões acerca do tema e definições de estratégias, além de um outro fator primordial que é a especificidade, já que ninguém é especialista em todas as áreas, daí a necessidade do trabalho em grupo.



2. Planejamento e avaliação



O planejamento como atividade docente é primordial, pois é através dele que as estratégias de ações serão definidas desde o tema até a avaliação, além do que se não houver um planejamento anterior feito por toda a equipe a atividade desenvolvida não poderá ser considerada uma prática interdisciplinar, já que nesse momento a presença do especialista é necessária e tudo isso perpassa pela avaliação que também é essencial, pois o professor que adota uma postura interdisciplinar não pode perceber a avaliação onde o conhecimento do aluno seja fragmentado, na verdade esse ponto é onde o aluno não pode ser considerado mero espectador e sim sujeito participativo, critico e reflexivo desse processo, pois, através da auto-avaliação todos se avaliam, nesse aspecto existe uma possibilidade imensa de crescimento e aperfeiçoamento de trabalho como um todo.

Portanto, como podemos perceber, para se exercer uma prática interdisciplinar muito são os pontos a serem elencados e trabalhados de maneira compromissada, criativa e estruturada, mas também não representa uma proposta metodológica impossível, muito pelo contrário, a viabilidade e eficácia já foram comprovadas em inúmeros estudos, mas se faz necessário uma postura consciente e perspicaz do docente, sensibilizando para a participação dos estudantes e de toda comunidade escolar.



6. Referência Bibliográfica



ALVES, Nilda (org). Formação de Professores: Pensar e Fazer. 3. Ed. São Paulo: Cortez, 1995.



BRASIL,Ministério da Educação Média e Tecnologia. Parâmetros Curriculares Nacionais. Ensino Fundamental. Brasília: Ministério da Educação, 1999.

FAZENDA, Ivani (coord). Práticas Interdisciplinares na escola. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1993.

________. Interdisciplinaridade: História, teoria e pesquisa. 2 ed. Campinas, SP:Papirus, 1995.

________. Didática e Interdisciplinaridade. 6 ed. São Paulo: Cortez, 1998.

HERNÁNDEZ, Fernando. A Organização do Currículo por projetos de Trabalho. 5 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

LENOIR, Yves. Lês Fondements de I’nterdisciplinarité dans La formation a I’enseignemente. Edition Du CPR,2001.

NOGUEIRA, Nilbo. Interdisciplinaridade Aplicada. São Paulo: Érica, 1998.

OLIVEIRA. Rita Patrícia Almeida de. Análise dos Mecanismos de Implantação de uma proposta interdisciplinar para o Ensino Fundamental e Médio numa Escola da rede privada. Recife: UFRPE, 2009

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